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O Aviso

Morando há quase seis décadas na mesma casa, distante uns 100 metros da entrada do único cemitério da cidade, local onde enterrara entre outros entes queridos, seu marido, falecido há cerca de oito anos, Dona Maria vivia sozinha, com sua rotina quebrada somente pela visita dos filhos e netos, que moravam na capital, e salvo vez ou outra, ali apareciam fora da temporada de férias escolares.

Nas cidades do interior deste imenso Brasil, as horas ainda passam devagar, o cheiro da comida boa e da lenha queimando no fogão exala por vários quilômetros e a vizinhança, quase que a mesma há décadas, porém envelhecidas pelo passar dos anos, são as principais companhias para os bate papos.

Certo dia, com a casa cheia de filhos, netos e dois dos amigos deles, que foram passar férias na casa de D. Maria, chega correndo e aos prantos, Manoel, o coveiro do cemitério, que costumeiramente ia até a casa tomar um café com bolinhos, carinhosamente preparados para ele, pela anfitriã.

O senhor que aparentava um pouco mais de cinquenta anos e que trabalhava ali há quase vinte, estava pálido e mal conseguia falar, o que causou espanto nos meninos da cidade grande, que ali se divertiam ao redor da improvisada churrasqueira.

O Aviso

Após um copo d’água e uma talagada na cachaça que sempre ficava em um pequeno armário atrás da porta principal da casa, já que um dos vizinhos possuía um alambique nas proximidades e presenteavam Dona Maria com uma garrafa sempre que a anterior se esvaziava, Manoel, ainda meio trêmulo, começou a falar o que tinha ocorrido e que nunca havia visto nada de anormal no cemitério nesses longos anos de serviços prestados no local e assim relatou:

– Estava eu em meio aos meus afazeres costumeiros de manutenção do cemitério, quando resolvi descansar um pouco e fumar um cigarrinho. Quando olhei para trás e avistei uma figura aterrorizante de uma mulher, com roupas sujas e velhas, visíveis sinais de putrefação e forte odor de enxofre, sorrindo para mim. Foi quando me levantei e saí correndo e vim para cá, jogando para o alto, algumas das ferramentas que estava utilizando e repousavam em meu colo.

O coveiro se negando a voltar ao cemitério, mesmo para pegar suas coisas, acabou por ir, acompanhado de dois dos genros de Dona Maria e alguns dos mais curiosos dos jovens que ali estavam. Manoel começou a juntar suas coisas com a ajuda de seus acompanhantes e novamente entrou em pânico, dizendo que havia visto mais uma vez a mesma figura feminina e que agora fazia sinal com um dos dedos, já com o osso da falange a mostra, como se fosse para segui-la.

Nenhum dos presentes no local vira algo de anormal por ali, muito menos conseguiram segurar o coveiro, que se retirou em disparada até a casa de Dona Maria, para outra dose da pinga e uma espécie de despedida, pois o mesmo afirmou que não voltaria a trabalhar ali e que se demitiria naquele mesmo dia.

Pouco mais de um mês se passou e chegou até D. Maria à notícia que Manoel tinha sido atropelado por um caminhão e morrera na hora, não restando muito de seu corpo para o enterro.

Mesmo tendo esta história ocorrida há mais de meio século, ela ainda é contada pelos moradores da cidade, sendo um deles, um dos jovens que adentrou o cemitério acompanhando Manoel e hoje um senhor de cabelos bem grisalhos, que afirma categoricamente, que era a morte clamando pela alma do pobre coveiro…

 

Autor
Meu nome é Aristides Pardo, sou professor de História da Rede Estadual do Paraná, Especialista em História: Cultura, Memória e Patrimônio e jornalista com 6 livros, diversos artigos e capítulos de livros publicados e que acredita que somente a educação pode oferecer um mundo melhor.

 

O Aviso
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