1.528 leituras

Conviver com o COVID-19: o Impacto no setor alimentício

Esta é uma pandemia que teremos por longo tempo, a não ser que consigamos uma imunização em grande escala, como por exemplo a imunização que foi realizada para a varíola e que demorou muitos anos. No entanto, há que se destacar que a comunidade científica sabe muito sobre o corona vírus, mas neste caso não sabemos qual será seu comportamento.

Existem incertezas de como será seu comportamento desde o ponto de vista estacional que somente o tempo nos mostrará, pois este vírus tem um comportamento muito agressivo e de alto contágio no inverno, menos impacto na primavera e outono e muito menos no verão. O que está óbvio para a comunidade científica é que este vírus será quase inofensivo quando a imunização da população estiver completa.

No entanto, a imunização pode ser alcançada de duas maneiras, a primeira é, quando o vírus se espalhe para uma grande parte da população mundial causando doença e morte e a outra é através de uma vacina. Perante esta situação, a comunidade científica está trabalhando contra o relógio para conseguir uma vacina que cumpra com todos os processos, protocolos e requisitos antes de ser usada em seres humanos, o que implica em, no mínimo 12 meses de trabalho.

Por outro lado, ainda há a possível imunização pelo contágio universal do vírus, porém com muitas dúvidas e com a falta de informação da comunidade cientifica e com a possibilidade de que as pessoas realmente adquiram a imunidade depois do contágio. Existem algumas evidências de que os infectados desenvolveram algum tipo de anticorpo, de acordo ao que se percebeu na China e em outros países, mas ainda não se conhece a capacidade de proteção que estes anticorpos podem desenvolver para ajudar às pessoas.

A pregunta que a comunidade científica está se fazendo é quanto tempo durará essa proteção adquirida: meses, anos? Ainda não se tem uma resposta. Na minha opinião, os estudos epidemiológicos devem se focar em quanto tempo deve durar essa proteção. Muita informação teremos depois que esta quantidade de contágios e infecções ao redor do mundo se concretize.

O que está óbvio é que esta pandemia poderá ser atenuada, a curva de crescimento de contágio poderá ser “aplainada” como está se fazendo na maioria dos países, porém os contágios serão inevitáveis. O que nos leva a outra pergunta, quando e quais são os cuidados para que voltemos a ter nossas vidas quotidianas, voltando ao trabalho, às aulas, enfim, à nossa vida normal?

Considerando estas condições, chegamos a uma conclusão que teremos que aprender a conviver com esta pandemia.

Mas como esta situação impactará na economia e em especial no setor alimentício? O que fazer?

A pandemia trouxe consequências e, com isto, alguns ganham e outros perdem, a realidade e o que se observa na maioria dos países afetados é que os serviços médicos e hospitalares, insumos para limpeza e desinfecção, serviços de TI, e-commerce, agricultura, indústria de alimentos e varejo no geral se beneficiaram. Isso revelou o quanto as pessoas dependem das cadeias de suprimento para a nutrição e alimentação.

No entanto, se a saúde publica é a máxima prioridade agora para nossos países, manter a sociedade e a economia em confinamento total durante muito tempo teria consequências negativas involuntárias e já começamos a ver certas situações que estão impactando na produção primária de diversos setores.

O toque de recolher e a quarentena poderia significar uma diminuição da provisão de alimentos nos países. As restrições de transporte poderiam afetar a mobilidade de imigrantes que trabalham temporariamente no setor agropecuário, porém não somente a eles. Estamos vendo como muitos trabalhadores rurais não conseguem chegar às unidades de produção, assim como empacotadoras ou indústrias de alimentos. Nos diversos países há relatos, de associações de trabalhadores e de indústrias, que informam que há um absenteísmo de até 40%, e isto somado às recomendações de distanciamento social complicam sobremaneira seu deslocamento aos seus postos de trabalho. Como consequência pode-se imaginar uma perda enorme de produtos que não poderiam ser colhidos caso não se solucione este problema de mão de obra.

Em muitos países latino-americanos, os agricultores estão se complicando com as exportações por via aérea e por via marítima. Há problemas vinculados ao transporte, pela escassez de motoristas, restrição de envios, problemas de portos e de serviços marítimos, além dos milhares de voos cancelados que porão em dificuldade as cadeias de suprimento de alimentos. Ainda que o varejo e os supermercados tenham estoques suficientes para os próximos meses poderiam sofrer alguma dificuldade futura para o abastecimento de alimentos.

Devemos acrescentar a esta realidade a percepção generalizada da fraqueza dos sistemas nacionais de saúde pública. No caso do setor alimentício, as pressões começam pela higiene dos profissionais que manipulam alimentos e as práticas e medidas que garantam a inocuidade alimentar. É importante frisar que não está comprovado que o Covid-19 se transmite através de alimentos, porém tem-se certeza de que há um temor generalizado da sociedade em contrair a doença por contato com superfícies de embalagens, sacolas plásticas, ou qualquer artigo que possa conter partículas de secreções de pessoas infectadas.

Alguns países começam a tomar medidas de ordem regional, como é o caso dos países membros do Conselho Agropecuário do Sul – CAS, formado por  Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia e Chile e seu convidado o Peru, que anunciou uma estratégia sanitária para o transporte de alimentos que considera o monitoramento da saúde de motoristas e manipuladores de alimentos, assim como as práticas de higiene de alimentos que garantam inocuidade.

Promotores e agroexportadores estão desenhando programas de avaliação para seus sistemas de gestão da qualidade e da inocuidade que reforcem a confiança dos mercados e clientes da qualidade.

No Equador, por exemplo, está se impulsionando a comercialização de cestas alimentares que são preparadas diretamente pelos agricultores e que se colocam à disposição do povo no geral, de acordo ao Ministério da Agricultura do Equador. Naquele país, a agência de controle sanitário e fitossanitário, a Agrocalidad, informa que está tomando todas as medidas para a inocuidade dos produtos.

Os países deveriam criar um grupo de trabalho nacional de especialistas e representantes públicos para realizar recomendações sobre como aliviar as restrições no trabalho e na vida pública e quando deveriam as indústrias reiniciar a sua produção.

Desde o ponto de vista do sistema sanitário dos diversos países, primeiro é importante entender que o COVID-19 é, a meu entender uma doença zoonótica (porém ainda muito estudo cientifico é necessário) por isso devemos avaliar o estado de seus sistemas sanitários o que incluiria a saúde pública, saúde animal e vegetal, para que a sua capacidade de responder a emergências sanitárias, vigilância epidemiológica, capacidade analítica, entre outros.

É ainda, fundamental fortalecer os mecanismos de análises de risco sanitário que permitam uma correta avaliação dos problemas, sua adequada gestão e, por conseguinte, uma estratégia de comunicação de riscos.

Por último, é importante estabelecer estratégias com as associações, setor privado e autoridades regionais nos países a fim de formar um mecanismo de capacitação e reforço de higiene pessoal e dos alimentos que garanta o seu adequado manuseio e gestão para a inocuidade dos alimentos ao longo da cadeia e, dando ênfase aos serviços de delivery.

Meu nome é Jaime Flores Ponce, sou doutor em Bioquímica de Alimentos, tenho dois filhos e moro em Guayaquil, no Equador.

Conviver com o COVID-19: o Impacto no setor alimentício
Avaliação: 5 estrelas
Total de votos: 2

One thought on “Conviver com o COVID-19: o Impacto no setor alimentício

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *