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O amor que transforma

Dom Rosendo era um típico morador da zona rural de Los Andes, uma pequena cidade próxima a Santiago, porém já no alto da Cordilheira dos Andes. Morava no final de uma estrada secundária e, como típico morador da zona rural daquela região seu deslocamento se dava sempre por cavalo ou por carroça puxada por seus três bois.

Além de servirem para sustento, os animais que tinha eram usados para o duro trabalho do campo, além de suas únicas companhias durante o dia de trabalho, pois apesar de morar sozinho, sua namorada não morava com ele, pois segundo ele dizia:

– Morar com a noiva antes de casar, dá azar!

Suas companhias, esporádicas eram seus vizinhos que sempre que ia até a cidade passava para cumprimentar ou para ajudar na colheita das uvas, que sempre eram transformadas em bom vinho.

Seus vizinhos, os Vallejos, Fernandez e os Villanueva sempre o admiraram por ser um homem muito ponderado, justo, trabalhador e principalmente por sua visão de coletivismo.

– Sou a favor da propriedade particular, antes de tudo. Meu patrimônio é fruto de meu esforço, mas devemos sempre ofertar nossos esforços a nossos irmãos compatriotas, pois o ser humano sozinho é muito pequeno para conseguir sobreviver sozinho neste planeta tão austero.

E de fato, a região é muito austera. Muito árida, de natureza muito hostil, contabilizando fortes ventos, neve, vulcões, terremotos… uma região em que o sustento é muito difícil.

– Todos os “ismos” são totalmente prejudiciais, entenda-se o nacionalismo, o liberalismo, o capitalismo, o marxismo, enfim todos resultado do egoísmo…Não importa se somos gaúchos[1], huasos[2] ou cholos[3], todos somos seres humanos e toda a visão que reduz as populações a unidades menores é prejudicial. Costumava dizer, Dom Rosendo.

E realmente Don Rosendo era presença constante quando os vizinhos precisavam, nas colheitas, para construir as casas, arrumar pontes, enfim, sempre se podia contar que ele apareceria com seu poncho, sua chupalla[4] montado em seu cavalo.

Carmen era o nome de sua amada e o dia de seu casamento estava marcado, para o início da primavera num local simples, uma plataforma de terra que servia de local para diversas comemorações. Don Rosendo estava ansioso para o casamento, pois à sua idade já estava cansado de morar sozinho e desde que conheceu Carmen mostrava-se um homem mais feliz.

Carmen era a moça mais bonita do bairro, tinha longos cabelos negros e olhos cor azul turquesa e seu coração foi entregue a Dom Rosendo na festa de casamento de uma amiga, em que ele recitou uma linda poesia sobre o amor. Ela lhe disse que nunca tinha ouvido algo tão sublime e que:

– A partir desta data meu coração é seu, Rosendo, porque você é o único homem que conheço e que sabe o que é o verdadeiro amor!

– Mas Carmencita, sou um homem mais velho que você, nosso relacionamento não é possível.

– Não importa a nossa idade, importa o amor, meus pais aceitarão. Respondeu ela, entregando-lhe sua mão para dançarem uma cueca[5].

O dia do casamento amanheceu ensolarado, todas as pessoas estavam felizes e esperando por Carmen que aparece linda, vestida de noiva. Após a cerimônia ela decide descer caminhando até o Lago do Inca. Chegando lá põe suas mãos na água e ao tentar tomar um gole, escorrega e cai dentro da água. Rosendo que a observava de longe, corre imediatamente para salvá-la, mas como a descida era muito íngreme ele demora mais do que deve e acaba chegando já com lágrimas nos olhos.

lago esmeralda chile

Contam os presentes, que Rosendo a toma nos braços e ao olhá-la, já sem vida, uma gota de lágrima lhe cai dos olhos, toca os de Carmencita e caem no lago, que fica da mesma cor dos olhos de Carmen, um lindo azul-turquesa. Os vizinhos contam que até hoje é possível ouvir os lamentos de Dom Rosendo que nunca mais se casou e que a cor azul turquesa dos olhos de Carmencita ainda está no Lago do Inca, principalmente nos dias de sol…

[1] Gaúchos neste caso são os moradores da zona rural da Argentina, vizinhos àquela região.

[2]Huasos são os moradores da zona rural do Chile.

[3]Cholos são os moradores da zona rural do Peru.

[4] Chapéu típico chileno.

[5]Cueca – a dança tipica do Chile.

 

Autor
Meu nome é Alvaro Concha, sou consultor de empresas, tenho 4 filhos e moro em Porto União, uma cidadezinha do interior do Brasil, no estado de Santa Catarina.

 

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